sexta-feira, 7 de maio de 2021

Carpe diem

Quando a noite chegava

Eu era a sua companhia,

Ela ligeiro a luz apagava

E o candeeiro acendia...


Sua cama ela ajeitava

Colocando o mosquiteiro

E antes de rezar abençoava

Este seu neto desordeiro...


Certo dia na cadeira de balanço

Colocou a mão sobre o coração,

A cadeira parou com seu descanso...


Mas balançou com minha aflição

E hoje em dia eu só avanço

Com o impulso da sua última lição. 

- Edjovaldo

Do raro amor fui um dos sorteados.

 Como uma linda borboleta a voar

Na simplicidade do vento livre

És minha bela e pura que vive

Neste peito aberto a ti amar


Nunca precisa bater para entrar

Onde tu já a muito tempo reside

Apesar da distancia que divide

És a lua que ilumina meu mar


Em alhures quando tu me quiseste

O frio tornou-se o calor que deste

Com o olhar e os beijos ilimitados


Tua ternura me deixou sem jeito

Eu um pobre andarilho suspeito

Do raro amor fui um dos sorteados.

- Edjovaldo

quarta-feira, 5 de maio de 2021

“Para minha infelicidade

 Eu me chamo Virgulino


Por alcunha Lampião


Sou cangaceiro afamado


Em todo alto sertão


Não levo em conta o inimigo


E não encaro perigo


Estando de arma na mão


 


Me juntei a Sebastião Pereira


Companheiro de desgraça


Quis queimar o Pajeú


Pra ver subindo a fumaça


Conheci que era valente


Pois Lampião não desmente


O brio da sua raça


 


A chupeta que carrego


É o rifle e a cartucheira


O leite é bala de chumbo


Muito veloz e certeira


Quem se julga pedra rocha


Venha ver se agüenta brocha


De Virgulino Ferreira


 


Nesse Pajeú das Flores


Fiz meu centro de ação


Sou senhor absoluto


De todo este sertão


Aqui quem quiser passar


Precisa se apresentar


Licença de Lampião


 


Quando pensei que podia


O caso estava sem jeito


Vou dar trabalho ao governo


Enfrentar de peito a peito


Vou trocar bala sem receio


Morrendo num tiroteio


Sei que morro satisfeito


 


Meu mano Antônio Ferreira


Cai na luta sem receio


Livino por sua vez


Não teme combate feio


Gosta de fazer zuada


Mas assombra a macacada


Quando cai no tiroteio


 


Eu, Antônio e Livino


Andamos pelo sertão


Soldado que nos enfrenta


Dá frio no coração


Porque já sabe que corre


E se for teimoso morre


Vai morar dentro do chão


 


Por minha infelicidade


Entrei nessa triste vida


Não gosto nem de contar


A minha história sentida


A desgraça enche meu rosto


Em minha alma entra um desgosto


Meu peito é uma ferida.


 


Quando me lembro senhores


Do meu tempo de inocente


Que brincava nos serrados


Do meu sertão sorridente


Sinto que meu coração


Magoado dessa paixão


Bate e chora amargamente


 


Cresci na casa paterna


Quis ser um homem de bem


Viver do meu trabalho


Sem ser pesado a ninguém


Fui almocreve na estrada


Fui até bom camarada


E tive amigos também


 


Tive também meus amores


Cultivei minha paixão


Amei uma flor mimosa


Filha lá do meu sertão


Sonhei em gozar a vida


Bem junto à prenda querida


A quem dei meu coração


 


Hoje sei que sou bandido


Como todo mundo diz


Porém já fui venturoso


Passei meu tempo feliz


Quando no colo materno


Gozei do carinho terno


De quem tanto bem eu quis


 


Meu rifle atira cantando


Em compasso assustados


Faz gosto brigar comigo


Por que sou bom cantador


Quando meu rifle trabalha


Minha voz longe se espalha


Zombando do próprio horror


 


Meu pai, minha mãe querida


Quiseram me ensinar


No seu colo carinhoso


Ela me ensinou a rezar


E a todos respeitar


Ele me ensinou nos campos


Eu menino a trabalhar


 


Nunca pensei que na vida


Fosse preciso brigar


Apesar de ter intrigas


Gostava de trabalhar


Mas hoje sou cangaceiro


E enfrentarei o balseiro


Até alguém me matar!

- Virgulino Ferreira (1898-1938)