sábado, 23 de outubro de 2021

Mãe

 Minha mãe pediu um beijo

Fui correndo lhe dei dois

Ela sorriu de contente

Perdi a conta depois

- Aguinelo de Souza Rodrigues 


Feliz o mundo seria 

Se governassem a terra

Somente as mães que algum dia

Perderam os filhos na guerra.

- Desconhecido

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Pois nem sempre língua É dona das frases que a boca diz. - João Paraibano.

Tem noites que canto mal

Mas quando eu canto feliz

Deus me mostra o verso pronto

E eu digo ao povo que fiz

Pois nem sempre a língua

É dona das frases que a boca diz.

- João Paraibano.

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

Peça abstrata que enfeita O museu do coração. - João Paraibano.

 


Poesia é a saudade

Da dor da separação

Nasce no pomar do peito

Pra fazer germinação

Peça abstrata que enfeita

O museu do coração.

- João Paraibano.

terça-feira, 12 de outubro de 2021

Melhor ser corno da minha Do que marido da tua. - João Paraibano

 Certa vez João Paraibano desafiou o violeiro Rogério Menezes numa sextilha que terminava assim:


"Não sei como tu aguentas 

uma mulher braba e feia"


Rogério aproveitou a deixa e atacou:


Minha Mulher é braba e feia,

Porém é digna e singela,

Sua mulher é bonita,

Entre todas, a mais bela,

Por isso que muitos ossos

Estão pulando a janela.


Na sequência João Paraibano respondeu:


A minha mulher é bela

Estando vestida ou nua,

Se parece uma sereia

Quando desfila na rua,

Melhor ser corno da minha

Do que marido da tua.

A coivara da seca está queimando Quase toda esperança do sertão. - João Paraibano

 Já no filme da seca a gente vê

A poeira da terra levantando

As abelhas sedentas doidejando

Por não ter flor aberta no ipê

As feridas que tem no massapê

Só parecem pegadas do verão

Onde tinha a corneta do carão

Hoje resta a cigarra assobiando

A coivara da seca está queimando

Quase toda esperança do sertão.

- João Paraibano.

sábado, 9 de outubro de 2021

Enquanto Deus existir Existirá poesia. - João Paraibano.

 Nossa poesia vem

Como flor na ventania

Pra mim, poesia e Deus

Nasceram no mesmo dia

Enquanto Deus existir

Existirá poesia.

- João Paraibano.

sexta-feira, 8 de outubro de 2021

Vou no trem da saudade todo dia Visitar o lugar que eu fui criado - João Paraibano

 No vagão da saudade eu tenho ido

Ver a casa que antes nasci nela

Uma lata de flores na janela

A parede de taipa e o chão varrido

Milho mole esperando ser moído

Numa máquina com ferro enferrujado

Que apesar da preguiça e do enfado

Mãe botava de pouco e eu moía

Vou no trem da saudade todo dia

Visitar o lugar que eu fui criado

- João Paraibano

quinta-feira, 7 de outubro de 2021

Nordestino, poeta e cantador. - João Paraibano

Já nasci inspirado no ponteio

Dos bordões da viola nordestina

Vendo as serras banhadas de neblina

Com uma lua imprensada pelo meio

Mãe fazendo oração de mão no seio

E uma rede ferindo o armador

Minha boca pagã cheirando a flor

Deslizando no bico do seu peito

Obrigado meu Deus por ter me feito

Nordestino, poeta e cantador.


Me criei com cuscuz e leite quente

Jerimum de fazenda e melancia

Com seis anos de idade eu já sabia

Quantas rimas se usava num repente

Fui nascido nas mãos da assistente

Na ausência dos olhos do doutor

Mamãe nunca fez sexo sem amor

Papai nunca abriu mão do seu direito

Obrigado meu Deus por ter me feito

Nordestino, poeta e cantador.


Fiz farofa de pão de mucunã

Me inspirei com o velhinho do roçado

O sertão é o palco esverdeado

Que eu ensaio as canções do amanhã

Minha artista da seca é acauã

No inverno o carão é meu cantor

Um imbu espremido é meu licor

Um juá eu não dou por um confeito

Obrigado meu deus por ter me feito

Nordestino, poeta e cantador.


Minha vida do campo foi liberto

Merendando café com milho assado

Vendo a lua nas brechas do telhado

E o vento empurrando a porta aberta

Um jumento me dando a hora certa

Já o galo era meu despertador

Meu mingau foi pirão de corredor

Eu cresci forte e gordo desse jeito

Obrigado meu deus por ter me feito

Nordestino, poeta e cantador.

- João Paraibano


sexta-feira, 7 de maio de 2021

Carpe diem

Quando a noite chegava

Eu era a sua companhia,

Ela ligeiro a luz apagava

E o candeeiro acendia...


Sua cama ela ajeitava

Colocando o mosquiteiro

E antes de rezar abençoava

Este seu neto desordeiro...


Certo dia na cadeira de balanço

Colocou a mão sobre o coração,

A cadeira parou com seu descanso...


Mas balançou com minha aflição

E hoje em dia eu só avanço

Com o impulso da sua última lição. 

- Edjovaldo

Do raro amor fui um dos sorteados.

 Como uma linda borboleta a voar

Na simplicidade do vento livre

És minha bela e pura que vive

Neste peito aberto a ti amar


Nunca precisa bater para entrar

Onde tu já a muito tempo reside

Apesar da distancia que divide

És a lua que ilumina meu mar


Em alhures quando tu me quiseste

O frio tornou-se o calor que deste

Com o olhar e os beijos ilimitados


Tua ternura me deixou sem jeito

Eu um pobre andarilho suspeito

Do raro amor fui um dos sorteados.

- Edjovaldo

quarta-feira, 5 de maio de 2021

“Para minha infelicidade

 Eu me chamo Virgulino


Por alcunha Lampião


Sou cangaceiro afamado


Em todo alto sertão


Não levo em conta o inimigo


E não encaro perigo


Estando de arma na mão


 


Me juntei a Sebastião Pereira


Companheiro de desgraça


Quis queimar o Pajeú


Pra ver subindo a fumaça


Conheci que era valente


Pois Lampião não desmente


O brio da sua raça


 


A chupeta que carrego


É o rifle e a cartucheira


O leite é bala de chumbo


Muito veloz e certeira


Quem se julga pedra rocha


Venha ver se agüenta brocha


De Virgulino Ferreira


 


Nesse Pajeú das Flores


Fiz meu centro de ação


Sou senhor absoluto


De todo este sertão


Aqui quem quiser passar


Precisa se apresentar


Licença de Lampião


 


Quando pensei que podia


O caso estava sem jeito


Vou dar trabalho ao governo


Enfrentar de peito a peito


Vou trocar bala sem receio


Morrendo num tiroteio


Sei que morro satisfeito


 


Meu mano Antônio Ferreira


Cai na luta sem receio


Livino por sua vez


Não teme combate feio


Gosta de fazer zuada


Mas assombra a macacada


Quando cai no tiroteio


 


Eu, Antônio e Livino


Andamos pelo sertão


Soldado que nos enfrenta


Dá frio no coração


Porque já sabe que corre


E se for teimoso morre


Vai morar dentro do chão


 


Por minha infelicidade


Entrei nessa triste vida


Não gosto nem de contar


A minha história sentida


A desgraça enche meu rosto


Em minha alma entra um desgosto


Meu peito é uma ferida.


 


Quando me lembro senhores


Do meu tempo de inocente


Que brincava nos serrados


Do meu sertão sorridente


Sinto que meu coração


Magoado dessa paixão


Bate e chora amargamente


 


Cresci na casa paterna


Quis ser um homem de bem


Viver do meu trabalho


Sem ser pesado a ninguém


Fui almocreve na estrada


Fui até bom camarada


E tive amigos também


 


Tive também meus amores


Cultivei minha paixão


Amei uma flor mimosa


Filha lá do meu sertão


Sonhei em gozar a vida


Bem junto à prenda querida


A quem dei meu coração


 


Hoje sei que sou bandido


Como todo mundo diz


Porém já fui venturoso


Passei meu tempo feliz


Quando no colo materno


Gozei do carinho terno


De quem tanto bem eu quis


 


Meu rifle atira cantando


Em compasso assustados


Faz gosto brigar comigo


Por que sou bom cantador


Quando meu rifle trabalha


Minha voz longe se espalha


Zombando do próprio horror


 


Meu pai, minha mãe querida


Quiseram me ensinar


No seu colo carinhoso


Ela me ensinou a rezar


E a todos respeitar


Ele me ensinou nos campos


Eu menino a trabalhar


 


Nunca pensei que na vida


Fosse preciso brigar


Apesar de ter intrigas


Gostava de trabalhar


Mas hoje sou cangaceiro


E enfrentarei o balseiro


Até alguém me matar!

- Virgulino Ferreira (1898-1938)