Minha mãe pediu um beijo
Fui correndo lhe dei dois
Ela sorriu de contente
Perdi a conta depois
- Aguinelo de Souza Rodrigues
Feliz o mundo seria
Se governassem a terra
Somente as mães que algum dia
Perderam os filhos na guerra.
- Desconhecido
Minha mãe pediu um beijo
Fui correndo lhe dei dois
Ela sorriu de contente
Perdi a conta depois
- Aguinelo de Souza Rodrigues
Feliz o mundo seria
Se governassem a terra
Somente as mães que algum dia
Perderam os filhos na guerra.
- Desconhecido
Tem noites que canto mal
Mas quando eu canto feliz
Deus me mostra o verso pronto
E eu digo ao povo que fiz
Pois nem sempre a língua
É dona das frases que a boca diz.
- João Paraibano.
Poesia é a saudade
Da dor da separação
Nasce no pomar do peito
Pra fazer germinação
Peça abstrata que enfeita
O museu do coração.
- João Paraibano.
Certa vez João Paraibano desafiou o violeiro Rogério Menezes numa sextilha que terminava assim:
"Não sei como tu aguentas
uma mulher braba e feia"
Rogério aproveitou a deixa e atacou:
Minha Mulher é braba e feia,
Porém é digna e singela,
Sua mulher é bonita,
Entre todas, a mais bela,
Por isso que muitos ossos
Estão pulando a janela.
Na sequência João Paraibano respondeu:
A minha mulher é bela
Estando vestida ou nua,
Se parece uma sereia
Quando desfila na rua,
Melhor ser corno da minha
Do que marido da tua.
Já no filme da seca a gente vê
A poeira da terra levantando
As abelhas sedentas doidejando
Por não ter flor aberta no ipê
As feridas que tem no massapê
Só parecem pegadas do verão
Onde tinha a corneta do carão
Hoje resta a cigarra assobiando
A coivara da seca está queimando
Quase toda esperança do sertão.
- João Paraibano.
Nossa poesia vem
Como flor na ventania
Pra mim, poesia e Deus
Nasceram no mesmo dia
Enquanto Deus existir
Existirá poesia.
No vagão da saudade eu tenho ido
Ver a casa que antes nasci nela
Uma lata de flores na janela
A parede de taipa e o chão varrido
Milho mole esperando ser moído
Numa máquina com ferro enferrujado
Que apesar da preguiça e do enfado
Mãe botava de pouco e eu moía
Vou no trem da saudade todo dia
Visitar o lugar que eu fui criado
- João Paraibano
Já nasci inspirado no ponteio
Dos bordões da viola nordestina
Vendo as serras banhadas de neblina
Com uma lua imprensada pelo meio
Mãe fazendo oração de mão no seio
E uma rede ferindo o armador
Minha boca pagã cheirando a flor
Deslizando no bico do seu peito
Obrigado meu Deus por ter me feito
Nordestino, poeta e cantador.
Me criei com cuscuz e leite quente
Jerimum de fazenda e melancia
Com seis anos de idade eu já sabia
Quantas rimas se usava num repente
Fui nascido nas mãos da assistente
Na ausência dos olhos do doutor
Mamãe nunca fez sexo sem amor
Papai nunca abriu mão do seu direito
Obrigado meu Deus por ter me feito
Nordestino, poeta e cantador.
Fiz farofa de pão de mucunã
Me inspirei com o velhinho do roçado
O sertão é o palco esverdeado
Que eu ensaio as canções do amanhã
Minha artista da seca é acauã
No inverno o carão é meu cantor
Um imbu espremido é meu licor
Um juá eu não dou por um confeito
Obrigado meu deus por ter me feito
Nordestino, poeta e cantador.
Minha vida do campo foi liberto
Merendando café com milho assado
Vendo a lua nas brechas do telhado
E o vento empurrando a porta aberta
Um jumento me dando a hora certa
Já o galo era meu despertador
Meu mingau foi pirão de corredor
Eu cresci forte e gordo desse jeito
Obrigado meu deus por ter me feito
Nordestino, poeta e cantador.
- João Paraibano
Quando a noite chegava
Eu era a sua companhia,
Ela ligeiro a luz apagava
E o candeeiro acendia...
Sua cama ela ajeitava
Colocando o mosquiteiro
E antes de rezar abençoava
Este seu neto desordeiro...
Certo dia na cadeira de balanço
Colocou a mão sobre o coração,
A cadeira parou com seu descanso...
Mas balançou com minha aflição
E hoje em dia eu só avanço
Com o impulso da sua última lição.
- Edjovaldo
Como uma linda borboleta a voar
Na simplicidade do vento livre
És minha bela e pura que vive
Neste peito aberto a ti amar
Nunca precisa bater para entrar
Onde tu já a muito tempo reside
Apesar da distancia que divide
És a lua que ilumina meu mar
Em alhures quando tu me quiseste
O frio tornou-se o calor que deste
Com o olhar e os beijos ilimitados
Tua ternura me deixou sem jeito
Eu um pobre andarilho suspeito
Do raro amor fui um dos sorteados.
Eu me chamo Virgulino
Por alcunha Lampião
Sou cangaceiro afamado
Em todo alto sertão
Não levo em conta o inimigo
E não encaro perigo
Estando de arma na mão
Me juntei a Sebastião Pereira
Companheiro de desgraça
Quis queimar o Pajeú
Pra ver subindo a fumaça
Conheci que era valente
Pois Lampião não desmente
O brio da sua raça
A chupeta que carrego
É o rifle e a cartucheira
O leite é bala de chumbo
Muito veloz e certeira
Quem se julga pedra rocha
Venha ver se agüenta brocha
De Virgulino Ferreira
Nesse Pajeú das Flores
Fiz meu centro de ação
Sou senhor absoluto
De todo este sertão
Aqui quem quiser passar
Precisa se apresentar
Licença de Lampião
Quando pensei que podia
O caso estava sem jeito
Vou dar trabalho ao governo
Enfrentar de peito a peito
Vou trocar bala sem receio
Morrendo num tiroteio
Sei que morro satisfeito
Meu mano Antônio Ferreira
Cai na luta sem receio
Livino por sua vez
Não teme combate feio
Gosta de fazer zuada
Mas assombra a macacada
Quando cai no tiroteio
Eu, Antônio e Livino
Andamos pelo sertão
Soldado que nos enfrenta
Dá frio no coração
Porque já sabe que corre
E se for teimoso morre
Vai morar dentro do chão
Por minha infelicidade
Entrei nessa triste vida
Não gosto nem de contar
A minha história sentida
A desgraça enche meu rosto
Em minha alma entra um desgosto
Meu peito é uma ferida.
Quando me lembro senhores
Do meu tempo de inocente
Que brincava nos serrados
Do meu sertão sorridente
Sinto que meu coração
Magoado dessa paixão
Bate e chora amargamente
Cresci na casa paterna
Quis ser um homem de bem
Viver do meu trabalho
Sem ser pesado a ninguém
Fui almocreve na estrada
Fui até bom camarada
E tive amigos também
Tive também meus amores
Cultivei minha paixão
Amei uma flor mimosa
Filha lá do meu sertão
Sonhei em gozar a vida
Bem junto à prenda querida
A quem dei meu coração
Hoje sei que sou bandido
Como todo mundo diz
Porém já fui venturoso
Passei meu tempo feliz
Quando no colo materno
Gozei do carinho terno
De quem tanto bem eu quis
Meu rifle atira cantando
Em compasso assustados
Faz gosto brigar comigo
Por que sou bom cantador
Quando meu rifle trabalha
Minha voz longe se espalha
Zombando do próprio horror
Meu pai, minha mãe querida
Quiseram me ensinar
No seu colo carinhoso
Ela me ensinou a rezar
E a todos respeitar
Ele me ensinou nos campos
Eu menino a trabalhar
Nunca pensei que na vida
Fosse preciso brigar
Apesar de ter intrigas
Gostava de trabalhar
Mas hoje sou cangaceiro
E enfrentarei o balseiro
Até alguém me matar!
- Virgulino Ferreira (1898-1938)